A icterícia neonatal, ou hiperbilirrubinemia é a coloração amarelada da pele e esclera (“branco do olho”), decorrente do acúmulo de bilirrubina no soro e tecidos. Quando as células vermelhas do sangue envelhecem, nosso organismo trata de destruí-las, sendo que o produto final desta tarefa é a bilirrubina indireta, a qual é encaminhada ao fígado para que este possa transformá-la em bilirrubina direta eliminando-a. Mas quando o fígado não consegue metabolizar toda a bilirrubina encaminhada, ela se acumula no organismo, produzindo então a icterícia. Os recém – nascidos portadores de icterícia podem correr o risco da instalação de um quadro muito grave, a encefalopatia bilirrubínica (Kernicterus ou Icterícia Nuclear) (Verona, et al 2004).
Kernicterus é a impregnação bilirrubínica de regiões do cérebro na vigência de altas concentrações sanguíneas de bilirrubina não conjugada. A barreira hemoencefálica é normalmente impermeável à bilirrubina. Em recém-nascidos, especialmente em prematuros, a barreira pode porém ser vencida se a concentração de bilirrubina for muito alta (acima de 20 mg%).
A doença é uma complicação rara de hiperbilirrubinemia em neonatos resultante de uma deposição preferencial da bilirrubina indireta nos globos pálidos, núcleos subtalâmicos lateral e medial, hipocampo, putame, tálamo e núcleos dos nervos cranianos (especialmente III, IV e VI pares). Núcleos cerebelares e da medula oblonga também podem ser atingidos, assim como as substâncias branca e cinzenta dos hemisférios cerebrais. (Ribeiro et al., 2004). As áreas são impregnadas bilateralmente, com simetria quase especular, e nestes locais os neurônios morrem, ficando seqüelas permanentes.
Segundo Verona (2004), a encefalopatia bilirrubínica pode levar à morte ou determinar seqüelas neurológicas permanentes, constantes principalmente de surdez, retardo mental, déficit motor e atetose. As seqüelas neurológicas são mais comuns. O quadro clínico é extremamente variável de caso para caso, em grau e modo de comprometimento.
A maioria dessas crianças apresenta retardo de desenvolvimento neuropsicomotor quando comparadas com crianças normais da mesma idade. São crianças que demoram para firmar a cabeça, sentar, andar, pegar objetos entre outros atrasos como reconhecimento dos familiares e atraso no início da fala. Algumas delas, nos primeiros meses são irriquietas, agitadas, com choro e gritos imotivados e freqüentes. A surdez é uma das complicações mais freqüentes do Kernicterus, podendo ser de grau leve ou intenso, para todas as freqüências. Entretanto, o mais comum é a deficiência auditiva nos sons de alta freqüência.
As opções terapêuticas mais utilizadas, que reduzem a ocorrência da doença, são a fototerapia e a exsangüineotransfusão.Os níveis séricos de bilirrubina para a indicação de fototerapia não são considerados de maneira uniforme. A importância da fototerapia advém do fato de a bilirrubina indireta ser uma substância insolúvel em água. A irradiação luminosa resulta em uma reação de isomerização que torna a bilirrubina indireta solúvel em água, facilitando sua eliminação pelo organismo. Já a transfusão é uma terapia utilizada para remover a bilirrubina do sangue e é indicada para pacientes com níveis elevados de bilirrubina (>25mg/dl) e nos casos de níveis séricos crescentes mesmo com a aplicação das medidas terapêuticas convencionais. Em casos mais graves, acredita-se que lesões atingindo áreas corticais relacionadas à audição possam causar agnosia auditiva, paresia do olhar conjugado para cima, sinal do “sol poente” e alterações intelectuais.
É fundamental que haja o diagnóstico precoce, a partir do estreito seguimento clínico-laboratorial de crianças com fatores de risco para kernicterus e instalação imediata da terapêutica adequada (fototerapia e exsangüineotransfusão) são fundamentais para a prevenção de kernicterus. (Ribeiro et al., 2004).
RIBEIRO, AJV; BATIGÁLIA, VA; BATIGÁLIA F; KRONKA FC; RODRIGUEZ ALAAS. Kernicterus: relato de caso – breve revisão de literatura. In: Arq Ciênc Saúde, 11(1), p.55-8, jan-mar 2004.
VERONA, GCOA; MAISTRO, AP; BERNARDI, APA. Achados Audiológicos em um Paciente Portador de Kernicterus: Relato de Caso. In: Revista CEFAC, 6(4), p. 405-13, out-dez 2004.
Internet: http://anatpat.unicamp.br/bikernicterus.html